quarta-feira, 14 de julho de 2010

O palhaço do circo sem futuro (I)

"Tudo começou quando o filho morria de vergonha por que o pai era palhaço de um circo sem futuro. E ele cresceu sem dizer pros amigos onde o pai trabalhava. Sempre muito envergonhado, cresceu com a vida muito amargurada. Se formou em outra coisa. Um certo dia, recebe a notícia que o pai está no leito de morte. Ele corre lá, entra no quarto, tira a gravata, tira o paletó, se ajoelha e diz:

_Pai, me ensina a ser palhaço?...Pai, me ensina a ser palhaço?
_Isso não se ensina, seu bosta."

Não era nada fácil para Juan acordar cedo todos os dias e ir para o trabalho. Talvez por isso ele brincava todos os dias com Crono embaixo das cobertas, arriscando sempre que o tempo passasse e se esquecesse dele. Ele quase nunca tomava café da manhã. Ao escolher desafiar o tempo, ele perdia a oportunidade de comer o bom e velho pão com salame acompanhado de um copo de suco artificial, todas as manhãs.

Chegava então a hora de pegar ônibus, e para Juan, chegava a hora de sua primeira batalha diária. Esperar o ônibus sozinho, no frio e em um lugar estranho nunca foi um problema pra ele. Mas a partir do momento em que o ônibus apontava a esquina, o coração de Juan, parecia disparar.

Assim que entrava no ônibus, pagava ao trocador o valor absurdo da passagem, que também não era um problema pra Juan. Passava a roleta, sempre de cabeça baixa. Pra seu desconforto, o ônibus começava a se movimentar antes que ele pudesse se acomodar. Juan então teria que se apoiar nos bancos. E levantar a cabeça...isso sim era um problema pra Juan.

Ele erguia os olhos vagarosamente, imaginando, antes que pudesse fitar, cada pessoa que ali estava, cada olhar de repulsa que receberia, cada olhar de pena, de curiosidade, de desprezo e de chacota. Armava-se então com sua espada inconsciente e encarava cada passageiro como abutres que queriam se alimentar de todo seu medo e sua desconfiança. E a cada olhar que dava, Juan parecia deferir golpes fatais, que desviava todo sentimento que o olhar de alguém poderia trazer, e ainda furava-lhe os olhos como troco.

Dessa maneira ele atravessava todo o ônibus. Só assim então, sentava no canto da ultima sequência de cadeiras, se blindando de todos os olhares que caía sobre qualquer um que entrasse no ônibus. Para Juan, uma ameaça. Dali era só puxar o barbantinho do sinal. Dali era só levantar e descer pela porta de trás. Agora, precisava apenas chegar ao trabalho, lugar onde uma nova batalha se iniciaria. Juan então fechava seus olhos e se punha a ouvir música. Mas os fechava com força, como se afiasse seus olhos, sua arma, para a nova peleja que virá...

Um comentário:

Alexa disse...

Juan talvez fizesse de cada dia uma batalha, mas tinha fervor em destruir possíveis aliados tanto quanto tinha para destruir os inimigos.
Gostei bastante de seus textos, parabéns!
Beijo!